Segundo dia:
O sol hoje não viu meu quarto. As janelas ficaram fechadas pelo dia e, como conseqüência, mal ouvi se as crianças gritaram nas piscinas vizinhas. Mal ouvi os pássaros, pra falar a verdade.
Hoje minha casa tomou um banho de realidade, todos saíram, todos viram a luz do dia. Todos estão risonhos assistindo as vídeo-cassetadas.
Eu?…
Eu assisti seriados o dia inteiro. Supernatural, para manter minha cabeça ocupada. “Cabeça vazia é oficina do Diabo”, dizem por aí. Ontem, lá em baixo, o nada me torturava. Tanto é que chorei ao ver o lugar em que selei um último beijo.
Eu continuo o mesmo. Consigo rir e fazer piadas. Consigo comer pão, pegar dinheiro no banco, fazer barba. Mas não sou eu, não. Não há vida, não há o piano, não há desenhos. Meus olhos continuam castanho-escuros, mas sem aquele brilho.
Entenda, não é a verdade que me caça. A verdade é só um detalhe na minha vida. A verdade é como uma tatuagem ou uma cicatriz. Não há como negá-la, ela está lá, acompanhando-nos o tempo inteiro. Já doeu, mas não durou tanto. Agora é só uma marca.
O que ainda dói, é o silêncio. O nada. A ausência. Essa estupidez inexistente! Como é que pode um murro não dado doer com tamanha intensidade? Preferia que me tivessem espancado, de verdade. Que me tivessem arrancado sangue, deixado no hospital. Mas o silêncio é tortura.
O abandono é a morte.
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