segunda-feira, 8 de abril de 2013

Essência

Perder a essência. Eis um medo que era constante na minha vida. Não apenas em mim, mas naqueles que me circundam (ou circundavam).

Eu era extremamente apegado às essências das pessoas. Ora, é a essência que fazia a pessoa. Era a sua personalidade, era o seu ser, o seu jeito de aparecer ao mundo. E eu era parte desse mundo. Se a essência fosse um odor ou uma comida eu era o seu maior crítico. Experimentei muitas essências por aí, muitas não apelavam ao meu gosto, mas muitas eram caras para mim.

Aí elas se foram. Como o odor de flores que se esvai com o tempo quando da natureza elas são retiradas. Como aquela brisa leve depois de uma caminhada cansativa que nos toca as têmporas e depois vai embora sem pedir por favor.

Perderam-se muitas das minhas caras essências. Uma amiga que fazia piadas deixou de fazê-las, um amigo que desenhava qualquer coisa não mais o faz. Uma irmã que cantava a voz se esvaiu. Um certo eu que era artista silenciou-se abruptamente.

Anteontem, porém, na escuridão e no conforto da hora de dormir de meu sobrinho pequeno ouço a esperança. Ouço algo familiar e novo, um canto manso, uma essência que não se foi. Olho para o lado e lá está minha irmã acalmando o neném com a sua voz - a mesma voz de sempre - transmutada de modo situacional. Veio-me um calor no coração talvez de todas as essências do mundo, como se todas voltassem para mim retrabalhadas. E com isso, esperança para mim.

Eis que não se perde a essência, então, eu suponho. E como dizia nosso pai, em paráfrase de um grande líder, "há de se endurecer, mas perder a ternura jamais".



terça-feira, 26 de março de 2013

Feliz e contente

Essa frase é clássica. Um jargão, praticamente. "Estou feliz e contente".

Muitos aprendem na escola que feliz e contente são sinônimos. Então seria esse jargão uma redundância? Ora, se está feliz, logo está contente, e pronto, acabou. Não precisa dos dois.

Só que não é bem assim. Feliz é uma coisa, contente é outra. Podem ser similares, mas muitas vezes há oceanos de diferença entre eles.

Feliz é da felicidade, é de estar radiante, alegre, sorrindo porque algo bom aconteceu. E algo bom é algo que na nossa ideia faz bem para a nossa alma, o nosso ser. Felicidade é, para muitos, um objetivo, um troféu adquirido quando um desafio é vencido. Para outros, felicidade é uma consequência dos seus atos positivos, morais.

Contente não, contente vem de contentamento, de ter recebido algo que é o suficiente para determinado fim.   Não necessariamente é um sentimento positivo, é apenas uma dedução. Joãozinho está contente porque ele passou de ano. Ele estaria feliz se tivesse passado com a nota máxima, mas como tirou a nota mínima para passar de ano, está contente.

Está contentado, está acomodado (e não incomodado), está - talvez - estático, inerte.

Não consigo não imaginar que uma pessoa inerte esteja apenas esperando que algo aconteça. "Seja mais você", "a vida é sua, dê um jeito nela", "tome as rédeas da sua vida", "seja dono do seu próprio nariz", "faça acontecer", nenhuma dessas frases tem efeito com quem está contente. Elas são a nota máxima, não a média. A média contenta.

Desacredito e desaprovo das torcidas. De que nascemos e morremos sozinhos. Meu jogo se joga junto, basta todos querermos.

Jogar só contenta. Jogar junto é a felicidade.