domingo, 15 de agosto de 2010

Religiosidade cientificista

“Saudações”, ouvi enquanto andava. Olhei para um lado. Olhei para o outro. Não havia ninguem na rua. Só eu e as árvores. Pensei por alguns instantes que as árvores falavam, mas era tolo demais. Prossegui.

“Nós somos tudo”, ouvi novamente. Parei. Eu não estava ficando louco nem surdo. A voz que falava comigo não tinha som. Não vinha de fora. De alguma maneira inexplicável, vinha de dentro e eu podia ouví-la de longe e de perto, dos próprios poros da terra e dos meus. Estanquei.

“Quem é você?'”, perguntei atônito.

“Nós somos tudo”, repetiu. Não era uma voz, eram muitas, mas era uma só. Um uníssono destoante e ainda assim perfeitamente harmonioso.

“Pare de falar em enigmas. Já estou farto dos eventos que me circundam para isso”.

“Nós somos a vida. Uma raça qualquer como os seres humanos, os cães, os insetos e as plantas.”

“Uma raça alienígena?”

“Uma raça. Raças de fora da Terra ou de dentro. Tudo são espécies”.

“Nunca conheci uma raça que eu não pudesse ver, ou que se pudesse comunicar comigo sem ser humana”.

“Você não conhece tudo.”

“É verdade. Mas mesmo assim, posso estar louco. Não estou vendo vocês. Nem sentindo seu cheiro ou o seu calor. Se eu abanar minha mão na minha frente só sentirei o ar. Você não é o ar. Não é matéria”.

“Você não conhece toda a matéria. Sua tabela periódica é faltosa. Tem buracos de elementos que existem, mas incompreensíveis pela capacidade humana por enquanto. Somos uma massa de seres, um campo de energia invisivel e imensurável, por enquanto”

“Uma espécie tem indivíduos. Estou falando com um ser só?”

“Sim. E não. Nós somos muitos, mas somos um. Como formigas, abelhas e sua consciência coletiva.”

“Em que plano vocês estão? Tempo-espaço? Outras dimensões?”

“O tempo e o espaço são medidas relativas criada pelos homens para resolver os problemas dos homens. Nós não somos os homens. Não somente. Para nós, é tudo diferente. Existimos, mas estamos fora da compreensão humana, por enquanto”.

“Se é assim, por que entrar em contato conosco?”

“Porque tudo se liga. As estrelas no espaço, uma folha de árvore que cai ao seu lado. ‘Uma borboleta batendo suas asas’, se assim você preferir. Tudo faz parte de uma complexa máquina ligada uma com a outra. Dinâmica em sua ordem, mas estática e definida no seu próprio caos. O destino é tão aleatório quanto o acaso é pré-definido. O universo entre destino e acaso é tão vasto que a mente humana só é capaz de assimilar um ou outro. Nós somos todo o resto.”

“É verdade. Eu estou constantemente perdido se devo acreditar em destino ou acaso”.

“Aceite também o universo entre eles. Aceite a nós”.

“Vocês não responderam muito bem a minha pergunta. Que tipo de influência vocês têm sobre nós?”

“Nós estamos em todos os lugares, em cada célula, em cada partícula. Nosso movimento influencia o seu e, portanto, nosso poder é absoluto sobre vocês.”

“Então minhas escolhas não são minhas, são suas”.

“Se você e nós não formos um só, sim. Se você e nós estivermos conectados, em harmonia e em paz, então isso não faz diferença.”

Então, numa trovejada de esclarecimento, vi que tudo aquilo que aquela voz dizia, enfim, era familiar aos meus ouvidos. Comecei a sentir aquela raça misteriosa. Sentí-la em cada poro do meu corpo. Sentí-la em cada poro da Terra. Então entendi.

Estava afoito e indescritivelmente feliz. Ao que tudo fez sentido, precisei da pergunta – e da resposta resposta - cardeal.

“Quem é você afinal? E quem sou eu?”

“Eu sou Deus, e Jesus. O Pai, o Filho e o Espírito Santo. E você é o meu fillho”.

______________________________________

Pelo menos, é assim que eu penso. Sempre gostei de ficção-científica. Muito do que era o cinema agora é a realidade. Por que não isso também?

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Sobre ser diferente

Sempre achei bobeira quando o dizem. “Sou diferente”. É claro. Seu nariz é maior ou menor que o dos outros. Seu jeito de pegar no lápis e de cortar a carne.

Mas ao mesmo tempo, passei minha vida toda brigando contra o padrão. Tenho dúvidas se segui um padrão ao fazê-lo. Adolescentes, de um modo geral, podem ser muito hipócritas e paradoxais. Estou certo de que fui. Talvez ainda o seja.

Qual é o limite da unicidade? Será o mesmo limite da normalidade? Será que, para uma pessoa ser única ela deve ser anormal? Ou será que ser anormal é apenas mais uma faceta da diferença dos seres humanos?

Hoje, numa conversa, senti que talvez tenha ultrapassado alguns limites. Seriam esses limites da minha unicidae e, portanto,  limites da sanidade humana? Fui mal interpretado. Recebi um ralho. Uma frase que eu não gostaria de ter ouvido.

E olhem só. Cá estou eu novamente respondendo para o nada enquanto emudeci diante de alguém. É meu direito. Vou responder.

Vou responder pedindo desculpas. Não sou comum. Não sigo o padrão. Em muitos casos, nem mesmo o padrão do socialmente aceitável. Não sei se é por ser avant’garde. Sempre gostei de divergir, de experimentar, de ser excêntrico. Nunca tive problema com isso. As pessoas que se danem. Mas de inaceitação em inaceitação, as pessoas se vão indo. No final das contas restam alguns contatos tortos de internet. Alguns cumprimentos no meio da rua.

Moldar seu círculo social baseado em pessoas que te aceitem, no fim das contas, pode estar se mostrando inefetivo. Ninguem está dentro de mim. Ninguém vai ver como eu vejo, sentir como eu sinto. Comunicação, descubro, vai se tornando cada vez mais obsoleta. A arte, a expressão, o estímulo de uma experiência estética, é a única alternativa. Mas é abstrata. Para que uma pessoa sinta as coisas como eu as sinto, veja as coisas como eu as vejo e compreenda exatamente o que eu quero expor, ela precisa ter tido as mesmas experiências que eu tive. Isso não é fácil. As experiencias variam muito de pessoa para pessoa.

E voltamos à nossa unicidade.

Sou uma pessoa de experimentos. Vivo supondo e testando. Imaginando a reação das pessoas, colocando-as à prova. Ultimamente, minha premissa foi ser aberto. Na minha cabeça, ser aberto sobre aquilo que eu penso, sobre aquilo que eu gosto. Explicar o que me leva a pensar o que eu penso e gostar do que eu gosto. Ser franco, ser transparente.

É falho. Como seus ouvintes não têm o mesmo background que você, não viveram as mesmas experiências que você, eles tenderão a generalizar. Vão matar a sua unicidade. Vão transformá-lo num modelo pré-definido de tudo aquilo que ele são condicionados a acreditar como bom e verdadeiro. Farão um cristal lapidado e polido parecer uma rocha – talvez com um ou dois espacinhos brilhantes.

De fato, é besteira pensar que você não é único. Você é. Todos são. De forma similar, não é motivo de alarde que você seja diferente. Não seja pretensioso. Mas ainda assim, o limite que eu sabia existir, é mais restrito do que eu julgava anteriormente.

Destôo, mas não mais com graça e orgulho.

No final, não tenho certeza se sou cinzento demais para um mundo com muitas cores, ou se sou colorido demais num mundo gris e enfadonho.